Projeto Nossa Gente: três gerações ligadas ao Ifes
Conheça Fernanda e Mauro, irmãos cuja família tem uma longa história na instituição.
Adelino Quinamor Ferreira era o goleiro da equipe de Futsal da Escola Técnica de Vitória na 2ª edição dos Jogos Brasileiros Estudantis do Ensino Industrial (Jebei) realizado em Fortaleza, em 1967. Quando o jovem de Caratoíra* se vê diante de um pênalti, ouve de Lúcia Maria Borges, filha do então diretor Mauro Fontoura Borges que, se ele o defendesse, ela lhe daria um beijo. Ele não só agarrou o chute, como o time se sagrou campeão dos jogos. Apesar de parecer enredo de filme, é a história de como começou o namoro dos pais de Fernanda Borges Ferreira de Araújo, professora da Coordenadoria de Códigos e Linguagens e do Mestrado Profissional em Letras; e Mauro Fontoura Borges Neto, coordenador de Educação Física, ambos do Campus Vitória.
Eles são a terceira geração na instituição, descendentes de Mauro Fontoura Borges, diretor de 1961 a 1970. “Meus pais já se conheciam daqui, na época era costume o dirigente morar com a família na escola, e a minha mãe era a única menina da faixa etária dos estudantes. Foi meu avô que levou os alunos para o Jebei. Subiram pelo interior de ônibus até Fortaleza, onde começou a história do relacionamento deles, que completou 50 anos em dezembro passado”, conta a docente. “Nossa mãe corria e brincava por aqui, já nosso pai fez edificações. Ele entrou em 1966 e ficou até 1968”, complementa o coordenador.
“Como havia um incentivo na época, nosso avô também fundou a Escola Santa Bárbara, em 1969, com uma proposta montessoriana, isso enquanto estava afastado do cargo de diretor. Acabamos crescendo com uma ligação maior com a instituição que ele fundou, posteriormente comprada pela prefeitura e transformada na EMEF Maria Leonor Pereira da Silva. Nossa relação com o Ifes acontece mais pra frente”, comenta Mauro Neto. “Nosso vínculo com o instituto vem das histórias de quando minha mãe morava aqui. Ela veio para cá com sete anos e morou aqui por uns dez anos. Até hoje ela chama o Ifes de Escola Técnica. Depois ela se tornou professora de Educação Infantil e lecionou no Santa Bárbara. Já nosso pai começou a fazer engenharia, mas largou porque começou a dar aula e se apaixonou pela área de educação; acabou fazendo pedagogia. Ele foi nosso professor de matemática. Nós crescemos nesse ambiente de educação. Acabamos tomando rumos diferentes, mas sempre na área do ensino”, completa a irmã.
Para ambos, a sensação de ser parte dessa história realmente bateu quando chegaram ao campus Vitória. “Foi uma sensação diferente, senti mesmo a história do nosso avô. Muita gente veio falar comigo sobre ele, tanto servidores na ativa quanto aposentados que trabalharam com ele, muitos dos quais ele ajudou. Isso começou a mexer comigo. Depois que eu assumi a coordenação de Educação Física, realizando a arrumação, acabei encontrando muita coisa. Com o meu nome é difícil fugir, todo mundo que vê, principalmente os mais antigos, comenta”, conta o coordenador. “Eu acabo passando mais incógnita. Meu irmão fica mais em evidência. Como sou mais tímida, contava pontualmente, mas tenho muito orgulho dessa história, que é muito bonita. Quando cheguei aqui foi muito forte, ainda mais tendo em conta a minha construção acadêmica, de eu estar em uma escola técnica atuando em uma licenciatura em Letras. É uma dupla conquista, uma realização”, conclui Fernanda.
Fernanda começou no Ifes como professora substituta no Campus Aracruz em 2011, mas ainda naquele ano fez concurso e foi nomeada para Cachoeiro de Itapemirim. Foi removida para Vitória em 2013 para atuar na Colin e no Profletras. “Eu fui fazer licenciatura em Letras, mas nunca imaginei trabalhar no Ifes, porque essa escola sempre foi voltada para o ensino técnico. Em 2011 abriu a licenciatura em Letras. A gente não imaginava, cursos de humanas em um espaço tradicionalmente de ensino técnico”, comenta a docente.
Já Mauro Neto começou no Campus Itapina em 2016, foi removido para Viana em 2017 e em 2020 veio para Vitória e logo assumiu a coordenação de Educação Física. Sua relação profissional com o Ifes, porém, remonta a 2010, quando foram realizados os primeiros jogos nacionais, já como institutos federais, em Brasília. “Eu ainda não estava no Ifes, atuava como assessor técnico da Confederação Brasileira do Desporto Universitário (CBDU), que organizou esses jogos. Assim eu acabei trabalhando nesse primeiro torneio. Aí, em 2019, na comemoração da 10ª edição dos jogos nesse novo formato, em Guarapari, eu era o coordenador geral, já pelo Ifes, do campeonato nacional. Quando fui chamado para falar, tive a oportunidade contextualizar e trazer toda essa história de mais de cinquenta anos de jogos e do fato de isso tudo ter começado com o meu avô”.
Mauro Borges foi o idealizador do Jebei, cuja primeira edição aconteceu 1966, como uma forma de permitir, durante a ditadura, a reunião de alunos, algo proibido pelo regime. “Em 1966 nosso pai não participou dos jogos, pois ele tinha acabado de entrar na escola. Ele participou pela primeira vez em 67, quando aconteceu a história do começo do namoro deles”, explica Fernanda. “Em 1968 aconteceu a terceira edição do campeonato e o nosso pai era capitão do time de futsal, que ganhou novamente, o que gerou uma foto dele levantando o troféu. Em 2021, eu já era coordenador e nós estávamos limpando uma sala na parte de cima da arquibancada e acabei descobrindo o troféu de futsal do torneio de 1968. Lembrei da participação do meu pai, tirei uma foto e mandei para ele. Ele me disse que aquele era o troféu que havia levantado. Chamei-o para vir aqui e refizemos a histórica foto”, conta Mauro Neto.
Sobre o avô, dos dois irmãos, apenas Fernanda era nascida enquanto ele era vivo “Ele morreu quando ela tinha um ano e eu ainda estava na barriga da minha mãe”, conta Mauro Neto. Fernanda complementa: “Tanto que ele não tem o sobrenome da família do meu pai. Ele foi o primeiro neto a nascer e acabou ficando com o nome dele, que já tinha quatro netas e morreu jovem, aos 49 anos, de ataque cardíaco fulminante. Ele criou muitas oportunidades. O meu pai sempre fala que, para o Jebei, eles foram de ônibus para o Nordeste, horas e horas de viagem parando em várias cidades pelo caminho. Era um diretor muito próximo dos alunos. Quando a gente encontra algum servidor que o conheceu sempre falam bem. É uma pena que a gente não cresceu ouvindo as histórias da boca dele, ouvimos as que são contadas, é excelente também, mas é diferente”. “Eu tenho muito orgulho”, diz Mauro Neto. “Só escuto coisas boas do nosso avô. Principalmente isso de ter aberto o campus, tê-lo deixado mais popular, ajudado o Grêmio Ruy Barbosa, e promovido os jogos. Você vê que era um diretor diferenciado. Ele era bem progressista e sofreu perseguição dos militares, isso está até no livro do centenário. Engraçado que ele nunca foi comunista, ele era membro da UDN**, mas era visto pelos militares da época como alguém que queria expandir a escola, abrir para a comunidade, botar muita gente aqui dentro e acabava que isso, para eles, era coisa de quem queria fazer revolução”, conclui.
O vínculo entre os irmãos ultrapassa a história familiar e a vocação para o ensino; até o casamento deles foi no mesmo dia, em uma cerimônia dupla, que acaba virando motivo para brincadeira entre os dois. “O interessante é essa ligação: nosso avô era diretor, tinha uma filha, nosso pai era aluno, eles se conheceram por conta da escola, se casaram e a gente sempre atuou na área de educação e hoje estamos aqui”, completa Fernanda. Quando questionados sobre uma quarta geração no Ifes, ela prontamente responde: “Quem sabe? Ainda faltam alguns anos para nossos filhos tentarem entrar”.
* Bairro sede da escola de samba Novo Império, que em 2009 levou para a avenida o centenário do Ifes. (https://www.ifes.edu.br/noticias/11228-novo-imperio-homenageia-ifes-com-samba).
** “União Democrática Nacional (UDN) foi um partido político brasileiro, fundado em 1945, de orientação conservadora [...] caracterizou-se pela defesa do liberalismo clássico e da moralidade, e pela forte oposição ao populismo. Além disso, algumas de suas bandeiras eram a abertura econômica para o capital estrangeiro e a valorização da educação pública”. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Democr%C3%A1tica_Nacional (acesso em 23/02/2023).
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